Não tenhais medo, Deus está no barco – Padre Ivan
“É o tempo de reajustar a rota da vida rumo a Ti, Senhor, e aos outros” Papa Francisco
Na última sexta-feira (27), o mundo parou para contemplar a proteção de Deus, neste marco histórico, o gesto do sucessor de Pedro: a benção Urbi et Orbi (Para Roma e o mundo)[1]. Aquela cruz milagrosa[2] levada da Igreja de San Marcelo al Corso[3] onde se reconhece a graça alcançada: em 1522, a Peste negra atingiu violentamente a cidade de Roma, onde este sinal foi levado à Basílica de São Pedro e após o retorno, a peste havia cessado[4]. Francisco apresenta o ícone da fé cristã para fazermos memória da história de nossa salvação: a Esperança suspensa neste madeiro nos devolve a alegria de sermos salvos. Cita: “Perante o sofrimento, onde se mede o verdadeiro desenvolvimento dos nossos povos, descobrimos e experimentamos a oração sacerdotal de Jesus: Que todos sejam um só” (Jo 17, 21).
Inspirado por Deus, o Papa nos leva a percorrer a Via Crucis, nos conduzindo ao Mistério na bênção de hoje:
“Há semanas, parece que a tarde caiu. Densas trevas cobriram as nossas praças, ruas e cidades; apoderaram-se das nossas vidas, enchendo tudo de um silêncio ensurdecedor e de um vazio desolador… Nos vimos amedrontados e perdidos”.
Mas assim como Deus veio em socorro ao grito de lamento de seu povo, o Vigário de Cristo vem ressuscitar o Sopro vital em nós, para louvá-Lo e amá-Lo, rasgando nossos corações (Jl 2,13). E continua:
“Quantas pessoas rezam, se imolam e intercedem pelo bem de todos! A oração e o serviço silencioso: são as nossas armas vencedoras Ele se volta para os discípulos em tom de censura: “Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?” (Mt 4,40)[5].
A oração de hoje nos levou ao cenário do calvário: aquela praça vazia nunca esteve tão cheia. Diante da chuva e ao cair da tarde de Roma, vemos a solidão e o silêncio ensurdecedor de Sua entrega. Até mesmo na cruz envelhecida, com inúmeras imperfeições, marcada pelo tempo e pela intervenção divina na história, podemos contemplar ali, novamente, as feridas de Cristo abandonado por nós. A água que regava o presente, nos inseriu naqueles minutos no seio da Trindade. E naquele afresco, mural inédito aos homens, nos faz idear que, em seu suor e sangue tão nítidos, se renova em nós a certeza: além de Deus estar conosco por meio de seu Filho, Ele sente conosco cada dor, medo e dúvida. Em cada filho dele infectado por esta praga, move suas entranhas: inefável misericórdia que nos elege e protege.
Discreta, mas com a presença exuberante, a Virgem Maria[6], plena de graça, intercede pelos seus filhos a cada grito de dor. Diante do pedido de Jesus aos seus discípulos: “Não tenhais medo!” (Mt 14,27), encontramos na Mãe intemerata a resposta ao anjo que também exclama: “Não temas Maria!”(Lc 1,30). Que a Porta do Céu caminhe conosco para responder a este convite de Deus que “Chama-nos a aproveitar este tempo de prova como um tempo de decisão”.
Pe. Ivan Soares, diretor espiritual do secretariado diocesano de Itapetininga
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[1] Benção dada apenas: Na eleição do novo Papa, na Páscoa e no Natal.
[2] Na noite do dia 22 para o dia 23 de maio de 1519, a igreja sofreu um violento incêndio e ficou destruída. Ao amanhecer, as pessoas foram até lá para conferir os estragos e se depararam com o crucifixo do altar principal providencialmente intacto e iluminado por uma lamparina que, embora atingida pelas chamas, ainda ardia aos seus pés. Imediatamente, os fiéis disseram que era um milagre e os mais devotos começaram a se reunir todas as sextas-feiras para rezar e acender velas aos pés da imagem de madeira. Assim nasceu a “Archicofradía del Santísimo Crucifijo en Urbe”, que existe até hoje.
[3] Trata-se de uma igreja muito antiga (do século IV), fundada pelo Papa Marcelo I, que foi perseguido e condenado a realizar trabalhos pesados no escritório do serviço de entrega de correspondências do Estado. É lá que estão seus restos mortais.
[4] Desde o ano de 1650, o crucifixo milagroso é levado à Basílica de São Pedro, a cada 50 anos. Atrás da cruz contém o nome de cada Papa que o utilizou, o último Papa a utilizá-lo foi o Papa João Paulo II na Jornada do Perdão durante o Grande Jubileu do Ano 2000.
[5] Evangelho de Inspiração da Benção Urbi et Orbi.
[6] No ícone bizantino de Nossa Senhora: Salus Populi Romani: ‘Protetora do Povo Romano’. Título dado no século XIX para o ícone bizantino da virgem com o Menino Jesus.